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Parte 2: Sucessão do Cônjuge – Regime da Comunhão Parcial de Bens

Dentre os regimes de casamentos previstos na legislação, o da comunhão parcial, por ser o regime legal após a Lei 6.515/77 é o regime mais contratados pelos cônjuges. Sendo assim, o conhecimento das regras sobre a partilha dos bens em caso de falecimento de um dos cônjuges se mostra importantíssimo.

Sendo assim, trataremos abaixo os principais aspectos desse regime e seus impactos na sucessão.

O regime da comunhão parcial de bens está previsto no artigo 1.658 do Código Civil que assim disciplina:

Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.

No regime da comunhão parcial de bens, somente o patrimônio adquirido pelos cônjuges após a constituição da sociedade conjugal serão comunicáveis. A comunicabilidade se dará em 50% para cada cônjuge, não importando em nome de quem está registrado determinado bem ou a porcentagem que cada um contribui para a aquisição. Os bens que cada cônjuge possuía antes do casamento serão incomunicáveis. O artigo 1.659 do Código Civil disciplina os demais bens que não comporão o acervo partilhável.

Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:

I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;

II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;

III – as obrigações anteriores ao casamento;

IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;

V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;

VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

VII – as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Sabendo então que os bens adquiridos na constância do casamento são partilhados e os adquiridos antes do casamento são bens particulares, necessário trazer à baila o inserto no artigo 1.829, no qual regula a ordem da vocação hereditária do cônjuge.

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

Pela interpretação literal do artigo acima citado, apesar das críticas doutrinarias acerca de sua redação, claro é que o cônjuge sobrevivente somente terá participação na herança sobre os bens particulares, ou seja, os bens adquiridos antes do casamento. Sobre os bens adquiridos na constância do casamento o cônjuge sobrevivente tem direito a meação, ou seja, a metade de tudo que foi adquirido onerosamente enquanto vivo o cônjuge falecido.

Essa regra foi confirmada e teve jurisprudência consolidada através do excelente julgado abaixo:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. HERDEIRO NECESSÁRIO. EXISTÊNCIA DE DESCENDENTES DO CÔNJUGE FALECIDO.

CONCORRÊNCIA. ACERVO HEREDITÁRIO. EXISTÊNCIA DE BENS PARTICULARES DO DE CUJUS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA.

Não se constata violação ao art. 535 do Código de Processo Civil quando a Corte de origem dirime, fundamentadamente, todas as questões que lhe foram submetidas. Havendo manifestação expressa acerca dos temas necessários à integral solução da lide, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte, fica afastada qualquer omissão, contradição ou obscuridade. 2. Nos termos do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente, casado no regime de comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido somente quando este tiver deixado bens particulares. 3. A referida concorrência dar-se-á exclusivamente quanto aos bens particulares constantes do acervo hereditário do de cujus. 4. Recurso especial provido. (REsp 1368123/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/04/2015, DJe 08/06/2015)

Essa é a corrente majoritária que vem pautando as decisões e planos de partilhas, fundamentada no fato que uma vez inexistindo bens particulares é porque no acervo a ser partilhado existem somente bens comuns, e sobre esses o cônjuge sobrevivente já terá sua meação. Neste caso os outros 50% serão divididos em partes iguais para seus herdeiros (ascendentes ou descendentes).

Para melhor compreensão, abaixo tratarei de algumas simulações de partilha de bens:

 

A) COMUNHÃO PARCIAL – FALECIMENTO CÔNJUGE COM 02 FILHOS COMUNS OU NÃO COM BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA E ANTES DO CASAMENTO

Patrimônio Comum (constância do casamento): 20.000
Patrimônio Particular (antes do casamento): 15.000

DIVISÃO PATRIMÔNIO
Meação Cônjuge:                                       10.000
Herança Cônjuge:                                      5.000 –
divisão bens particulares
Filho 1                                                         10.000– divisão bens particulares
Filho 2                                                         10.000 – divisão bens particulares

Ou seja, neste exemplo a cônjuge sobrevivente ficaria com 15.000 (10.000 de meação + 5.000 dos bens particulares), pois dos bens comuns recebe 50% e os bens particulares foram divididos por 3.

Já os herdeiros Filhos, herdam cada um 10.000 (5.000 bens comuns + 5.000 bens particulares), pois a meação do falecido é dividida em 2 e os bens particulares em 3, devido a concorrência do cônjuge.

 

B) COMUNHÃO PARCIAL – FALECIMENTO CÔNJUGE COM 02 FILHOS COMUNS OU NÃO COM BENS ADQUIRIDOS SOMENTE NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO

Patrimônio Comum (constância do casamento): 20.000
Patrimônio Particular (antes do casamento): zero

DIVISÃO PATRIMÔNIO
Meação Cônjuge:                                       10.000
Herança Cônjuge:            
                          não há herança pois não há bens particulares
Filho 1                                                         5.000– divisão bens particulares
Filho 2                                                         5.000 – divisão bens particulares

Ou seja, neste exemplo a cônjuge sobrevivente ficaria com 10.000 (10.000 de meação), pois dos bens comuns recebe 50%. Como não há bens particulares não há herança somente meação.

Já os herdeiros Filhos, herdam cada um 5.000 (5.000 bens comuns), pois a meação do falecido é dividida em 2 sem a concorrência do cônjuge sobrevivente.

 

C) COMUNHÃO PARCIAL – FALECIMENTO CÔNJUGE CONCORRÊNCIA COM ASCENDENTES (PAIS)

Patrimônio Comum (constância do casamento): 20.000
Patrimônio Particular (antes do casamento): 15.000

DIVISÃO PATRIMÔNIO
Meação Cônjuge:                         10.000
Herança Cônjuge:            
            8.333 – divisão bens particulares + 50% da meação
Pai                                                  8.333 – divisão bens particulares
Mãe                                                8.333 – divisão bens particulares

Ou seja, neste exemplo a cônjuge sobrevivente ficaria com 18.333 (10.000 de meação + 8.333 dos bens particulares e meação do falecido), pois dos bens comuns recebe 50% e os bens particulares + 50% da meação do falecido foram divididos por 3.

Já os pais herdam cada um 8.333 (bens particulares + meação do falecido), pois soma-se os bens particulares + a meação do falecido e divide-se por 3.

 

D) COMUNHÃO PARCIAL – FALECIMENTO CÔNJUGE CONCORRÊNCIA COM AVÓS

Patrimônio Comum (constância do casamento): 20.000
Patrimônio Particular (antes do casamento): 15.000

DIVISÃO PATRIMÔNIO
Meação Cônjuge:                         10.000
Herança Cônjuge:            
            12.500 – divisão bens particulares + 50% da meação
Avô                                                 6.250 – divisão bens particulares + 50% da meação
Avó                                                 6.250 – divisão bens particulares + 50% da meação

Ou seja, neste exemplo a cônjuge sobrevivente ficaria com 22.500 (10.000 de meação + 12.500 dos bens particulares e meação do falecido), pois dos bens comuns recebe 50% e os bens particulares + 50% da meação, neste caso por regra do art. 1.837 CC, o cônjuge tocará a metade pois se trata de ascendente de 2º grau.

Já os avós herdam cada um 6.250 (bens particulares + meação do falecido), pois soma-se os bens particulares + a meação do falecido e eles possuem direito a metade.

Há uma infinidade de simulações possíveis, devendo ser avaliada de acordo com o caso concreto. Se trata de um assunto complexo com diversas regras e entendimentos, mas que a partir do Código visa, em regra, a proteção do cônjuge sobrevivente em todos os casos.

Autor: Diego Viscardi

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