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Artigo – A utilização do instituto da renúncia para dissolução societária

RENÚNCIA DE QUOTAS /AÇÕES

As quotas sociais (LTDA) ou ações (S/A) são patrimônios regulados como qualquer outro, pelo direito de propriedade, tendo o proprietário o poder de usar, gozar, dispor, além de reivindicar, de quem injustamente venha a possuir ou deter o bem. Além disso, a propriedade é um direito disponível, e como tal, pode ser perdido pela (i) alienação; (ii) abandono; (iii) perecimento; (iv) desapropriação; e, por fim, (v) pela renúncia, o ato pelo qual a propriedade será perdida sem que ocorra uma contraprestação ou transmissão do bem a um terceiro.

Assim, passamos a análise da possibilidade da desvinculação do sócio por meio da renúncia de quotas e/ou ações.  As situações em que o vínculo societário é encerrado, em relação a apenas um sócio, de modo que a atividade da sociedade permaneça com os remanescentes, ocasiona, em geral, a necessidade de se apurar de haveres, ou seja, procedimento que visa apurar o valor das respectivas quotas/ações.

Um sócio, por meio das formas ordinárias de dissolução, pode se retirar da sociedade, seja (i) pelo direito de retirada, devendo a sociedade apurar os haveres nos termos do contrato ou da lei; (ii) por meio da venda da posição societária, ocasião que perderá a propriedade por meio da alienação; (iii) ou mesmo perder a propriedade contra a sua vontade, em caso de exclusão, momento pelo qual o sócio perderá a propriedade de forma abrupta por decisão societária ou judicial.

Em todas as formas acima, geralmente se faz necessário que ocorra um consenso entre os sócios, seja um consenso sobre o valor dos haveres no direito de retirada, um consenso ao aceitar um novo sócio no caso de venda, ou mesmo um consenso ou validação judicial no caso de exclusão. Em todos os casos, uma característica é latente: o sócio receberá um valor pela propriedade até então detida, ou deverá reembolsar a empresa pelas dívidas existentes.

Pensando na atividade lucrativa, as formas citadas trazem uma roupagem que se adequa a realidade do dia a dia societário, uma vez que o sócio receberá o valor das quotas/ações, e a sociedade continuará com os remanescentes.

Importante frisar que, por força do princípio da autonomia patrimonial, tanto na LTDA, quanto na S/A, como característica principal, ambas possuem limitação da responsabilidade, ou seja, a responsabilidade é limitada ao capital investido. Tal limitação, geralmente, somente poderá ser mitigada quando comprovado algum tipo de fraude, simulação, abuso da personalidade jurídica, dentre outras formas. Esse é o cenário desejado: atividade lucrativa, o princípio da autonomia patrimonial sendo respeitado, e o sócio recebendo algum valor quando da sua desvinculação.

Mas, e quando a sociedade atua no vermelho, existe um passivo vinculado que afeta o relacionamento societário, afeta a lucratividade, afeta outros investimentos do sócio. Como se desvincular?

Muitas das vezes o consenso inexiste, e a saída de um sócio é dificultada, é tormentosa e problemática, mormente nesses casos em que existe dificuldade financeira/passivo, ou mesmo, quando um minoritário quer se retirar, mas não obtém o consenso do majoritário.  É nesse ponto que surge a possibilidade da desvinculação pela renúncia da participação societária.

Como premissa de tal instituto jurídico, importante ressaltar que diferentemente do direito de retirada, da venda das quotas ou mesmo da exclusão, na renúncia não ocorre qualquer apuração de haveres e pagamento ao sócio. Ou seja, a renúncia é uma forma de desvinculação em que o renunciante não receberá nenhuma contraprestação. Essa é a principal característica, inexistência de pagamento pela participação societária.

Como consequência desta característica, a pergunta que se faz é: qual razão levará um sócio a renunciar suas quotas e sair sem qualquer valor?  Podemos citar alguns casos em que a renúncia pode se mostrar a alternativa que melhor reflete o desejo do sócio, dentre outras situações, por exemplo, (i) quando a sociedade é deficitária, e na apuração dos haveres o saldo será negativo, não tendo saldo credor a receber; (ii) quando a pessoa é sócia de diversas empresas e uma delas é problemática e afeta a obtenção de recursos financeiros das outras, assim, pode o sócio renunciar a participação dessa empresa problemática e continuar com os ativos que são saudáveis; (iii) quando um minoritário investidor, sabendo que a sociedade não obterá os resultados esperados quer se desvincular para “estancar” os aportes financeiros futuros, e o majoritário não facilita sua saída.

Nesse sentido, se a atividade apresentar qualquer risco de perecimento patrimonial além do inicialmente aportado, a renúncia, desde que não caracterizada uma situação fraudulenta, é um mecanismo que pode ser utilizado para estancar a exposição patrimonial. A utilização da renúncia pode ser a roupagem jurídica ideal para o sócio se desligar da empresa, de modo a não comprometer todo seu acervo de ativos, bem como outras atividades empresariais.

Assim, em conclusão, a renúncia se usada para os fins de direito, é um instituto que possui grandes benefícios, de modo a resolver a situação societária de forma mais ágil e menos burocrática, do que um processo ordinário de dissolução parcial de sociedade, sendo uma alternativa eficaz que permite ao sócio
ter a limitação da responsabilidade restrita ao valor inicialmente investido, de modo a minimizar a exposição futura de seu patrimônio.

Artigo publicado no Valor Econômico
Autores: Rubens Bezerra Filho e Diego da Silva Viscardi

 

 

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